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quarta-feira, 22 de janeiro de 2020



O caos do transporte público no Brasil
ROBERTO MONTEIRO PINHO
É negável que o transporte público no Brasil seja um dos piores do mundo. Isso se prende basicamente a dois aspectos: a ganância empresarial e ausência de uma política estatal que prime pela qualidade de vida da população.

Pesquisas recentes mostram que apenas 32% dos brasileiros se locomovem por meio de transportes públicos, ou seja, ônibus, trens e metrôs. O restante da população utiliza o automóvel, a bicicleta, a motocicleta, a tração animal ou anda a pé.

O fato é que há anos que o transporte público nas principais cidades brasileiras entrou em colapso, apesar da existência de inúmeros projetos e planos de ação para a resolução do problema, sem contar a Lei de Mobilidade Urbana, sancionada em 2012, e, até hoje, sem resultados práticos e mais uma vez prorrogada, agora para abril de 2019.

Essa crise não pode ser ignorada pela sociedade, ainda mais que as estatísticas denunciam o crescimento das perdas de demanda, os aumentos tarifários superiores ao poder de compra da população, a má qualidade dos serviços, a redução da velocidade comercial decorrente dos congestionamentos e a deficiência na mobilidade urbana.

O surgimento de novos serviços baseados em plataformas digitais, como aplicativos de transporte (Uber, 99, Cabify), compartilhamento de bicicletas e patinetes elétricos, trouxe novas opções de deslocamento e transformou o transporte urbano. Como em todo processo de transição, há ganhadores e perdedores.

Os usuários do transporte coletivo, até então considerados cativos, agora possuem alternativas e, por conta disso, demandam maior qualidade e conveniência. Já os operadores de transporte público viram a sua demanda cair mais de 25% entre os anos de 2013 e 2019.

Segundo a Associação Nacional das Empresas de Transporte de Passageiros (NTU), a cada dia, mais e mais pessoas deixam de andar de ônibus, situação que acarreta numa perda de 3,6 milhões de passageiros por dia, em todo o país.

]Nos últimos vinte anos, o sistema brasileiro de transporte público por ônibus perdeu 36% de seus passageiros pagantes. Já os trens suburbanos e metrôs não vêm apresentando os crescimentos esperados para suas potencialidades como transporte de massa. Para agravar ainda mais a crise, 63% das cidades com mais de 300 mil habitantes possuem transporte ilegal, que, de forma preocupante, crescem a cada dia.

Um estudo da Associação Nacional de Transportes Públicos prevê que a falta de investimentos no transporte público, no curto prazo, duplicará o nível atual dos congestionamentos nos próximos dez anos, com severas perdas de tempo para as pessoas, além de aumentar os acidentes e a poluição nas grandes cidades.

De acordo com monitoramentos realizados pela NTU, atualmente, no país, existem 330 empreendimentos de transporte público por ônibus que podem ser classificados como travados, que somam quase 3 mil quilômetros de vias (90 sistemas BRT, 194 corredores de ônibus e 46 faixas exclusivas). Dos projetos prioritários sobre trilhos, entre 2017 e 2018, somente ocorreu a inauguração da Linha 2 do Metrô de Salvador (trecho Aeroporto-Acesso Norte).

Para que os investimentos em transporte público sejam exeqüíveis, há a necessidade de incentivos tributários e fiscais, associados a linhas de financiamento acessíveis para o setor, além de uma política de transporte público competente, planejada, integrada, física e tarifariamente, apartidária e continuada ao longo dos governos. Tudo isso possibilitaria um futuro melhor para as populações das regiões metropolitanas.

O transporte público é essencial para as cidades de médio e grande porte e deve ser considerado como uma necessidade humana básica, uma vez que é o único serviço que participa de todas as atividades da sociedade e afeta as pessoas todos os dias.

A Declaração Universal dos Direitos Humanos preconiza a igualdade entre os cidadãos quanto ao acesso aos serviços públicos de seus países, inclusive o transporte público. Entretanto, isso não vem sendo suficiente para sensibilizar os governantes no país. Penso que somente uma pressão permanente da sociedade organizada poderá mostrar aos governantes as necessidades da população.