O caos do transporte público no Brasil
ROBERTO MONTEIRO PINHO
É negável que o transporte público no Brasil
seja um dos piores do mundo. Isso se prende basicamente a dois aspectos: a
ganância empresarial e ausência de uma política estatal que prime pela
qualidade de vida da população.
Pesquisas recentes mostram que apenas 32% dos
brasileiros se locomovem por meio de transportes públicos, ou seja, ônibus,
trens e metrôs. O restante da população utiliza o automóvel, a bicicleta, a
motocicleta, a tração animal ou anda a pé.
O fato é que há anos que o transporte público
nas principais cidades brasileiras entrou em colapso, apesar da existência de
inúmeros projetos e planos de ação para a resolução do problema, sem contar a
Lei de Mobilidade Urbana, sancionada em 2012, e, até hoje, sem resultados
práticos e mais uma vez prorrogada, agora para abril de 2019.
Essa crise não pode ser ignorada pela
sociedade, ainda mais que as estatísticas denunciam o crescimento das perdas de
demanda, os aumentos tarifários superiores ao poder de compra da população, a
má qualidade dos serviços, a redução da velocidade comercial decorrente dos
congestionamentos e a deficiência na mobilidade urbana.
O surgimento de novos serviços baseados em
plataformas digitais, como aplicativos de transporte (Uber, 99, Cabify),
compartilhamento de bicicletas e patinetes elétricos, trouxe novas opções de
deslocamento e transformou o transporte urbano. Como em todo processo de
transição, há ganhadores e perdedores.
Os usuários do transporte coletivo, até então
considerados cativos, agora possuem alternativas e, por conta disso, demandam
maior qualidade e conveniência. Já os operadores de transporte público viram a
sua demanda cair mais de 25% entre os anos de 2013 e 2019.
Segundo a Associação Nacional das Empresas de
Transporte de Passageiros (NTU), a cada dia, mais e mais pessoas deixam de
andar de ônibus, situação que acarreta numa perda de 3,6 milhões de passageiros
por dia, em todo o país.
]Nos últimos vinte anos, o sistema brasileiro
de transporte público por ônibus perdeu 36% de seus passageiros pagantes. Já os
trens suburbanos e metrôs não vêm apresentando os crescimentos esperados para
suas potencialidades como transporte de massa. Para agravar ainda mais a crise,
63% das cidades com mais de 300 mil habitantes possuem transporte ilegal, que,
de forma preocupante, crescem a cada dia.
Um estudo da Associação Nacional de
Transportes Públicos prevê que a falta de investimentos no transporte público,
no curto prazo, duplicará o nível atual dos congestionamentos nos próximos dez
anos, com severas perdas de tempo para as pessoas, além de aumentar os
acidentes e a poluição nas grandes cidades.
De acordo com monitoramentos realizados pela
NTU, atualmente, no país, existem 330 empreendimentos de transporte público por
ônibus que podem ser classificados como travados, que somam quase 3 mil
quilômetros de vias (90 sistemas BRT, 194 corredores de ônibus e 46 faixas
exclusivas). Dos projetos prioritários sobre trilhos, entre 2017 e 2018,
somente ocorreu a inauguração da Linha 2 do Metrô de Salvador (trecho
Aeroporto-Acesso Norte).
Para que os investimentos em transporte
público sejam exeqüíveis, há a necessidade de incentivos tributários e fiscais,
associados a linhas de financiamento acessíveis para o setor, além de uma
política de transporte público competente, planejada, integrada, física e
tarifariamente, apartidária e continuada ao longo dos governos. Tudo isso
possibilitaria um futuro melhor para as populações das regiões metropolitanas.
O transporte público é essencial para as
cidades de médio e grande porte e deve ser considerado como uma necessidade
humana básica, uma vez que é o único serviço que participa de todas as
atividades da sociedade e afeta as pessoas todos os dias.
A Declaração Universal dos Direitos Humanos
preconiza a igualdade entre os cidadãos quanto ao acesso aos serviços públicos
de seus países, inclusive o transporte público. Entretanto, isso não vem sendo
suficiente para sensibilizar os governantes no país. Penso que somente uma
pressão permanente da sociedade organizada poderá mostrar aos governantes as
necessidades da população.